Última modificación: 2018-11-27
Resumen
Este artigo tem como objetivo refletir sobre a centralidade da presença narrativa da escritora Carolina Maria de Jesus (1914-1977), considerada pela sociedade brasileira como “criatura exótica”. Vítima do racismo estrutural, por ser uma mulher negra e residente de favela, tinha em sua autoria um fazer literário penetrante com capilaridade chegando a reivindicar sua participação e projeção nos espaços formais que legitimam a autoria. Nossa ênfase recai no seu primeiro livro “quarto de despejo” (1960), que teve uma tiragem inicial de 80 mil exemplares, um fenômeno de vendagem até para os padrões atuais, superando nomes consagrados como Jorge Amado à época. Este livro chegou a ser traduzido para o exterior, e teve publicação em 13 línguas. Trata-se de um texto autobiográfico, onde Carolina Maria de Jesus exprimiu leituras particulares de mundo e realizou desenhos reflexivos sobre as suas insuficiências. A escrita era sua válvula de escape, buscando resistência e existência dando voz aos excluídos através dos seus relatos diários. Adotou o lugar narrativo de denúncia por descrever a precária situação dos moradores que viviam à margem da sociedade. O testemunho reivindica o seu lugar de enunciação, com isso rompe com o silêncio, a condição de subalternidade, os estereótipos e a invisibilidade da mulher negra na literatura. Ao assumir sua voz de mulher e negra, ela se desvincula da hegemonia eurocêntrica, da branquitude, do patriarcalismo e do sexismo que marcam o cânone literário. A nosso ver, a autora rompe com a tradição desconstruindo a história oficial que foi consolidada a partir de símbolos, como afirma Quijano que denominou esses aspectos como sendo parte da colonialidade do poder, do saber e do ser. Para o desenvolvimento do estudo e como suporte teórico, adotou-se as leituras de Spivak (2010), Carneiro (2003) Miranda (2011), Quijano, (2007), Barcellos (2015) Jesus (1960).